A correção do fator de potência no âmbito industrial é um assunto pautado como prioridade, principalmente para o atendimento aos limites impostos pela legislação e, assim, evitar a cobrança de multas na conta de energia por consumo excedente de reativos.
Neste contexto, a “correção do fator de potência” e “a aplicação de bancos de capacitores puros” sempre foram o problema e a solução – normalmente correlacionados. Entretanto, esta relação não é mais uma verdade absoluta.
O fator de potência é a razão da potência ativa (que efetivamente realiza trabalho) pela potência aparente (potência disponível no sistema elétrico), e é um importante indicador do aproveitamento energético, disponibilidade e estabilidade do sistema e da instalação. O fator de potência relaciona-se ainda com o consumo de potência reativa, potência que embora seja necessária para a excitação de máquinas eletromagnéticas como transformadores e motores, não realiza trabalho.
Um alto fator de potência, normalmente próximo de 1 (um), significa que o sistema elétrico e/ou instalação estão em boas condições de aproveitamento da potência consumida da concessionária, uma vez que o consumo é predominantemente de potência ativa.
Um baixo fator de potência aponta que o sistema elétrico e/ou instalação encontra-se ocupado com o transporte e consumo de energia reativa, o que compromete o aproveitamento energético e a disponibilidade de potência para a realização de trabalho.
Como o consumo de reativos é algo inerente ao funcionamento de máquinas eletromagnéticas e, portanto, necessário, há a necessidade da chamada “compensação reativa”, que em outras palavras promove o fornecimento de energia reativa para estes equipamentos, eximindo a concessionária de tal. Esta medida traz importantes benefícios como a melhoria da estabilidade de tensão do sistema elétrico, a desocupação desnecessária da instalação pelo transporte de energia reativa e a redução da conta de energia, principalmente em casos onde a instalação é penalizada devido ao baixo fator de potência.
A compensação reativa é normalmente realizada por equipamentos chamados de “capacitores” ou “bancos de capacitores”, os quais fornecem a energia reativa necessária mas trazem consigo características importantes que merecem atenção especial na especificação e projeto das soluções.
Nos últimos anos, com o advento da eletrônica de potência e dos dispositivos semicondutores, a descoberta de novas topologias de hardwares e a modernização de sistemas de disparo proporcionou o desenvolvimento de inúmeras possibilidades de modificação do sinal elétrico em prol da versatilidade operacional de máquinas úteis ao ser humano, além da redução das dimensões e aumento da eficiência dos equipamentos. Neste contexto, a utilização da eletrônica de potência passou a ser bem mais difundida no âmbito industrial. O efeito colateral desse avanço tecnológico foi a geração de distorção harmônica no sistema elétrico.
Equipamentos como os inversores de frequência permitem o controle da tensão e da frequência de saída através da retificação e posterior chaveamento da tensão retificada, produzindo uma tensão novamente alternada. Equipamentos como softstarts operam modificando diretamente o sinal alternado da tensão de entrada (senoidal em 60Hz), através da alteração do ângulo de disparo das chaves utilizadas nestes equipamentos.
Contudo, o efeito on/off provocado pelo ligamento e desligamento dos tiristores e diodos empregados nos circuitos retificadores e controladores de motores provocam a inserção de componentes de elevadas frequências na rede elétrica, tais componentes são as harmônicas. A figura 1 abaixo ilustra a forma de onda de corrente de um retificador trifásico de 6 pulsos, para exemplificar a não linearidade deste tipo de carga.
A distorção da forma de onda de corrente, provocada por circuitos eletrônicos, em outras palavras reproduz o efeito de soma de diversas frequências ao sinal anteriormente senoidal puro e em 60Hz.
A interação de bancos de capacitores, utilizados para a compensação reativa, com sinais de tensão e corrente distorcidos devido à existência de harmônicas pode ocasionar efeitos nocivos ou muitas vezes danosos à instalação. O efeito mais comum que ocorre em bancos de capacitores submetidos às tensões harmônicas é a ressonância.
A ressonância ocorre quando a reatância indutiva equivalente no ponto de acoplamento do capacitor ao sistema é igual à reatância capacitiva inerente ao banco de capacitores. Esse fenômeno se dá a uma dada frequência, ou como normalmente é descrito, na frequência de ressonância. Nesta situação, o que se tem é um circuito RLC (circuito provido de resistor-indutor-capacitor) que tende sua impedância à zero e, portanto, tem-se um comportamento semelhante a de um curto circuito: correntes elevadas e principalmente alterações térmicas dos materiais em função do efeito joule.
A presença de harmônicas no sistema pode também ser um agente prejudicial ao fator de potência da instalação. Diversos autores ao longo dos anos apresentaram contribuições científicas a respeito de metodologias de cálculo que melhor representassem o equacionamento das potências em ambientes distorcidos. Tais metodologias, por consequência, elucidam também o cálculo do fator de potência.
O fator de potência apresenta dois aspectos fundamentais: o fator de deslocamento e o fator de distorção. O fator de deslocamento é a característica que expressa a defasagem angular entre as formas de onda de tensão e corrente circulantes em um sistema elétrico. Quando fundamentalmente senoidais, o fator de potência é predominantemente de “deslocamento”, ou seja, é exatamente o cosseno do ângulo da defasagem entre a tensão e a corrente elétrica.
Entretanto, em instalações onde existe a circulação de harmônicas, o fator de potência total é descrito pelo produto de ambos fatores de deslocamento e de distorção. Neste caso, o fator de distorção (ou verdadeiro) é utilizado para a correção dos valores RMS da tensão e da corrente, compostos não apenas pelas grandezas na frequência fundamental, mas também nas frequências harmônicas.
As equações 1a e 1b abaixo apresentam o cálculo do “fator de potência total” considerando os efeitos das harmônicas.
Onde:
É possível concluir que o fator de potência total pode ser igual ou inferior ao fator de deslocamento, ou cos (φ), em ambientes providos de harmônicas.
A figura 2 abaixo representa graficamente o comportamento do fator de potência total em função da distorção harmônica de corrente.
A solução para compensação reativa, quando aplicada em instalações onde existe circulação de correntes harmônicas, deve ser especificada considerando alguns cuidados essenciais quanto à ressonância e efetividade da correção do fator de potência. A aplicação de filtros harmônicos passivos normalmente traz bons resultados, sejam para a compensação reativa e correção do fator de potência, seja para mitigação harmônica.
Filtros harmônicos passivos são equipamentos que combinam em diversas topologias elementos como indutores e capacitores. São projetados no intuito de oferecer uma baixa impedância para determinadas correntes harmônicas, drenando-as. O projeto de um filtro passivo deve atentar aos aspectos e limitações construtivas dos componentes empregados, sejam indutores e capacitores ou elementos de manobra e proteção como contatores, disjuntores e fusíveis. Deve ainda ser dimensionado mediante a característica de cada instalação, não existindo uma solução “de prateleira”.
Assim como boa parte das soluções de compensação reativa, os filtros podem ser automáticos e projetados para fornecer a quantidade ideal de potência reativa requerida pelo sistema. Este controle normalmente é executado por equipamentos de medição e controle microprocessados e capazes de inserir ou retirar, mediante a um setpoint, estágios de capacitores-indutores.
Contudo, para a especificação de uma solução de custo-benefício atraente, bom respaldo técnico e com a esperada eficiência de operação é altamente recomendável a execução de um “estudo de fluxo de cargas e fluxo de harmônicos” da instalação. Através de análises dos equipamentos, medições e simulações computacionais é possível obter com boa fidedignidade as mais diversas condições de operação e de contingência, considerando cenários com e sem a solução proposta e apresentando os resultados. O estudo também pode ser realizado com posterior medição comprovativa, conforme cada cliente e necessidade.
Os avanços tecnológicos na ciência eletroeletrônica favoreceram o desenvolvimento de importantes soluções e equipamentos para aumentar o aproveitamento da energia elétrica. Tais soluções são imprescindíveis para a manutenção da disponibilidade energética, redução de consumo e elevação da competitividade do setor produtivo, visto o aumento gradual da demanda de produtos em função do aumento populacional e devido aos elevados custos da energia elétrica no Brasil.
Equipamentos como acionamentos eletrônicos de motores ou novas tecnologias de sistemas de iluminação, por exemplo, embora favoreçam a redução do consumo de energia elétrica industrial, quando instalados no sistema elétrico originam distúrbios que requerem medidas de controle, para que outros problemas não sejam gerados ou agravados. O distúrbio mais comum neste caso é a geração de distorção harmônica, que além de prejudicar o fator de potência da instalação, pode ocasionar o aumento de perdas ou até a queima de equipamentos utilizados para a compensação reativa. Neste contexto, a mudança cultural por parte dos consumidores e fornecedores de energia, também tem papel fundamental para a correção das instalações atuais e para que futuros projetos sejam concebidos respeitando os critérios adequados, viabilizando ações que favoreçam a qualidade de energia elétrica e a eficiência energética.
Para saber mais sobre a distorção harmônica e como podemos ajudar a sua empresa, entre em contato com a Focus.